Cidade pequena pode ser cidade inteligente?

Será que vale a pena você trabalhar com cidades pequenas? Para te responder essa pergunta, trouxe alguns dados divulgados pelo IBGE em 2021. Vamos ver como é a distribuição dos municípios no Brasil por faixa populacional:

Em 1 de julho de 2021 a população do Brasil chegou 213,3 milhões de habitantes. Desses, mais de 35 milhões estão estão concentrados em 4 cidades:

  1. São Paulo – 12,4 MM
  2. Rio de Janeiro – 6,8MM
  3. Brasília – 3,1MM
  4. Salvador – 2,9MM

Ok, mas o que isso quer dizer? Veja bem, o Brasil tem 5.570 municípios ao todo:

  • Mas apenas 17 possuem uma população maior que 1 milhão de habitantes, isso equivale a 21,9% da população brasileira (46,7MM de pessoas)
  • Somente 49 possuem mais de 500 mil habitantes, concentrando 31,9% da população do país (68MM de pessoas)
  • 326 municípios tem mais de 100 mil habitantes, totalizando 67,7% da população (123MM de pessoas)
  • 1.474 tem a população entre 20 e 100 mil habitantes, ou seja: 26,5% da população (56,5MM de pessoas)
  • 3.770 possuem menos de 20 mil habitantes e concentram 14,8% da população (31,6MM de pessoas)

Vamos visualizar de outra forma:

94% da população vive em municípios com menos de 100 mil habitantes e esses municípios concentram mais de 40% da população brasileira (aproximadamente 90 milhões de pessoas).

Desses, quase 70% possui menos de 20 mil habitantes. Ou seja: o Brasil é um país de pequenas cidades.

Então, se a gente quer fazer do Brasil uma nação inteligente, sustentável, eficiente, humana, empreendedora, criativa… Nossos programas de política pública não podem excluir as cidades pequenas (com menos de 100 mil habitantes).

Nós nunca seremos um país inteligente se deixarmos 70% dos municípios ou 30 milhões de pessoas de fora das políticas públicas.

É verdade que essas cidades possuem grandes desafios para captar recursos e conseguir trazer projetos – mas isso é uma oportunidade para você.

Por que a cidades pequenas são a maior oportunidade para os consultores em cidades inteligentes?

94% dos 5.570 municípios no Brasil representa mais de 5.200 cidades.

Mesmo sendo menores, na prática eles precisam fazer as mesmas coisas que cidades grandes como São Paulo, Rio de Janeiro e Brasília fazem. Todos precisam criar políticas públicas na área de saúde, educação, cultura, esporte, assistência social… só que na realidade estão totalmente à margem das consultorias para cidades inteligentes, porque ninguém está atuando nesses municípios.

Todo mundo está olhando para as cidades grandes. Todas as empresas, todos os agentes… todos brigando para atuar nesses municípios maiores, enquanto temos mais de 5 mil municípios sem concorrência.

A demanda para trabalhar numa cidade pequena é gigantesca. Se isso não te convencer a olhar para elas, saiba que além disso é mais fácil, mais barato e consideravelmente mais rápido implantar os projetos nelas. É por isso que trabalhar com cidades pequenas é a maior oportunidade para consultores em cidades inteligentes.

E você consegue ganhar em quantidade: São Paulo equivale a 2.414 municípios, para que você tenha uma noção.

Vamos entender qual é o tamanho do mercado de cidades inteligentes:

Onde tem gente, tem demanda

Uma pesquisa da ONU sobre a população mundial mostra que 94% da população brasileira estará vivendo em áreas urbanas no Brasil até 2030. Hoje, 82% já vivem em áreas urbanas.

Agora, para que você reflita: com essa flexibilização que aconteceu na dinâmica do trabalho, onde as pessoas podem trabalhar cada vez mais em home office, o que você acha que vai acontecer?

Será que elas vão querer continuar trabalhando no centro de São Paulo ou vão começar a procurar por alternativas melhores? Vão continuar numa cidade com poluição sonora e muita violência ou vão migrar para cidades menores, que promovam mais qualidade de vida, tenham menores índices de violência e mais acesso à espaços verdes?

O que está acontecendo hoje é justamente isso: as pessoas estão saindo dos grandes centros, buscando uma melhor qualidade de vida, já que agora não precisam mais estar presencialmente no seu local de trabalho.

E o que precisamos fazer diante disso? Começar a preparar essas cidades menores para receberem esse fluxo de gente chegando.

Plano Diretor e os 26 planos municipais

O plano diretor é um instrumento de planejamento estratégico que deve estar presente em todos os municípios brasileiros. Ele é o mais importante e o mais estratégico. É o pilar, a fundação da implantação de uma cidade inteligente no Brasil. Mas é somente um dentro de uma lista de 26 planos municipais que a cidades precisam fazer. Entretanto, o que acontece hoje é que 94% dos municípios não tem esses instrumentos de planejamento – mas vão precisar fazer.

Quando aplicamos a oficina CHESI nos municípios pequenos, a gente passa por um checklist para verificarmos em que pé estão cada um desses planos. E o que a gente vê é que pelo menos 70% dos planos municipais obrigatórios nunca foram realizados naquele município, não estão nem em processo de criação. A grande maioria nem sabia que precisava fazer tudo aquilo.

Sabe o que isso quer dizer? São mais de 5.000 municípios com 70% dos instrumentos de planejamento para serem realizados. É muita demanda. É demanda para todas as áreas.

Plano de turismo, contenção de riscos, resíduos, saneamento, educação, saúde, agricultura, desenvolvimento econômico, governança, T.I, dados abertos…. plano que não acaba mais!

Mas me responda: para transformar uma cidade comum em uma cidade inteligente, fazer o alinhamento dos 26 instrumentos de planejamento e ainda alinhar os interesses dos cinco agentes da inovação: o que você considera mais fácil, mais barato e mais rápido: uma cidade com mais de 1 milhão de habitantes ou com menos de 100 mil?

A verdade é que quanto menor a cidade, mais fácil, mais barato e mais rápido. E sabe por quê? Em uma cidade pequena existe um sentimento de pertencimento, de zelo pela cidade, as pessoas se conhecem. Numa cidade com mais de 500 mil habitantes, as pessoas são muito mais fechadas, muitas vezes nem conhecem seus vizinhos, de forma que é muito mais difíicil engajar os agentes da inovação num projeto coletivo numa cidade grande.

"Mas uma cidade com menos de 20 mil habitantes não tem a obrigatoriedade de elaborar um Plano Diretor"

Essa questão é sempre levantada, ainda que o estatuto das cidades já exista há mais de 20 anos. O artigo 41 traz 5 incisos que trazem as situações em que o Plano é obrigatório.

Art. 41. O plano diretor é obrigatório para cidades:
I – com mais de vinte mil habitantes;
II – integrantes de regiões metropolitanas e aglomerações urbanas;
III – onde o Poder Público municipal pretenda utilizar os instrumentos previstos no § 4o do art. 182 da Constituição Federal ;
IV – integrantes de áreas de especial interesse turístico;
V – inseridas na área de influência de empreendimentos ou atividades com significativo impacto ambiental de âmbito regional ou nacional.
VI – incluídas no cadastro nacional de Municípios com áreas suscetíveis à ocorrência de deslizamentos de grande impacto, inundações bruscas ou processos geológicos ou hidrológicos correlatos. (Incluído pela Lei nº 12.608, de 2012)
 
  • Se o município faz parte de uma região metropolitana ou aglomerações urbanas (o estado de Santa Catarina dividiu todos os seus 300 municípios em regiões metropolitanas – e vários Estados também fizeram isso), ele precisa fazer o plano diretor.
  • Se o município localizou um lote vago e quer desapropriar o imóvel ou cobrar IPTU, por exemplo, ele precisa fazer o plano diretor.
  • Se o município quer promover o turismo e captar recursos em Brasília, ele precisa fazer o plano diretor.
  • Se o município tem uma grande hidrelétrica ou está próximo de uma usina nuclear e até mesmo de rodovias federais, ele precisa fazer o plano diretor.
  • Se está numa área suscetível a inundações, deslizamentos impactos e quer receber recurso nacional para apoio de calamidades de mudanças climáticas, inundações, deslizamentos e etc, ele precisa fazer o plano diretor.

E se tem que fazer o plano diretor, tem que fazer todos os outros.

Se o município não fizer, pode sofrer consequências bem pesadas – como o prefeito ser preso ou ser multado pelo Ministério Público, por exemplo.

Você como consultor em cidades inteligentes precisa ter clareza de como isso funciona e em quais casos esses instrumentos são obrigatórios. É isso que vai abrir as portas pra você.

Os gestores das cidades que possuem menos de 20 mil habitantes muitas vezes não sabem que esses planos precisam ser feitos. Então, quando você chegar e mostrar essa obrigatoriedade, vai ter a possibilidade de apresentar uma proposta numa cidade que não tem concorrência e ainda livra os gestores do risco de serem presos ou multados por estarem cometendo um crime que nem sabem que estão cometendo.

Agora, imagina o que é você chegar no município pequeno e apresentar um mapa para os gestores, que normalmente são muito bem intencionados (pessoas que estão na gestão de uma cidade pequena sentem um carinho por sua cidade e querem vê-la funcionando), mas que não sabem o quê e nem como fazer.

É claro que não vai ser um caminho em linha reta e sem obstáculos, mas é seu papel enquanto consultor contornar esses obstáculos, dialogar com os agentes e responder as perguntas.

3 pré-requisitos para implantar as cidades inteligentes

Planejamento

Envolvimento dos 5 agentes da inovação:

Muitas vezes todas as situações acabam recaindo sobre o gestor público, porque os outros agentes não fazem a sua parte.

Você enquanto consultor precisa trazer essa responsabilidade de volta para esses agentes, mostrando que o governo precisa fazer parcerias com ONGs, empresas e universidades, além de explicar para o cidadão qual seu papel e o que está acontecendo.

É seu papel, também, argumentar que se deve trazer inclusive a oposição para perto para que se haja diálogo, se entenda e possa tentar fazer com que ela deixe de ser uma oposição.

Não tem como fazer a construção de um projeto coletivo que chegue ao projeto da cidade que queremos deixando agentes de fora. É necessário conversar com todo mundo – e numa cidade pequena isso é muito mais fácil! Alinhar os interesses envolvidos ali é muito menos complexos do que numa cidade com meio milhão de habitantes.

Alinhamento de planos e projetos pra captar recursos

Existe um processo técnico administrativo para captar recursos e todas as cidades precisam, necessariamente, passar por ele para conseguir – e a maior parte das cidades pequenas nem sabe que isso existe.
É isso que os gestores querem: dinheiro. Mas sem o processo, a cidade não vai conseguir. E aí entra você consultor, de novo trazendo a solução, tendo o conhecimento e sabendo o que precisa ser feito para que a cidade consiga o recurso necessário para destravar e se transformar numa cidade inteligente.

Depois de analisar todos esses dados, a minha resposta para a pergunta que fizemos lá no começo é apenas uma: sim, vale muito a pena trabalhar com cidades pequenas. E não poderia ser diferente já que as chances de você ter sucesso são maiores e a velocidade para enxergar os resultados é maior.

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